A grande falácia na história de Steve Jobs abandonando o cargo de principal executivo da Apple,
que você encontrará em notícias espalhadas por toda a mídia é esta: em
1985, depois que Jobs deixou a Apple, a companhia entrou em um processo
de queda que a levou à beira da falência. E a Apple de 2011 corre o
risco de voltar a esse caminho.
Os argumentos históricos até são verdadeiros. Steve Jobs deixou a
empresa na metade dos anos 1980, e os executivos que ficaram na
liderança da empresa (Sculley, Spindler e Amelio) cuidaram para que a
companhia quase fosse à falência pelos 12 anos seguintes. Mas a falha no
enredo de "repetição da história” é que a Apple de hoje não tem nada a
ver com a empresa de 1985.
Quando Jobs deixou a companhia pela primeira vez, eu estava
terminando meu primeiro ano na escola secundária. Como resultado, eu não
tenho muita experiência de bastidores sobre aquela era.
Mas oito anos depois, eu estava cobrindo a Apple. E pude presenciar a
gestão de três CEOs que tomaram várias decisões péssimas que levaram a
companhia para um caminho desastroso. Enquanto isso, Steve Jobs,
construía uma interessante empresa de sistemas operacionais, mas que
ninguém dava muita atenção.
A mágica aconteceu quando Jobs voltou para a Apple. Apesar de dizer
que Gil Amelio quase acabou com a companhia, tenho que admitir que ele
também tomou a decisão que salvou a empresa: ele comprou a Next e não
apenas obteve a base do sistema operacional Mac OS X (e, eventualmente a
do iOS), como também trouxe Jobs de volta.
Em 1997, Jobs guiou a Apple com poder absoluto, o tipo de poder que
ele nunca teve durante sua primeira passagem pela companhia. Jobs era o
cofundador, sim, e o tempo que passou trabalhando com o time que criou o
Macintosh era a bagagem que o tornou uma lenda. Mas a Apple de 1985 não
era "a empresa de Steve Jobs”.
A Apple de 1985 não era "a empresa de Steve Jobs"
Quando ele assumiu o cargo de CEO interino, mais de uma década
depois, ele não cometeu o mesmo erro. Mais velho e experiente, e com o
suporte total do conselho de diretores da Apple, Jobs reconstruiu a
companhia de seu modo.
O iMac foi o primeiro e rápido sinal da
mudança. E o lançamento do iPod e a decisão de abrir lojas da Apple
foram muito importantes. A chegada do iPhone e do iPad consolidaram o
que a Apple é hoje: a mais importante empresa de tecnologia do mundo.
A
Apple de hoje é extremamente lucrativa, com dezenas de bilhões de
dólares no cofre, quase 90% do mercado de tablets, rapidamente ampliando
a sua fatia no mercado de smartphones em todo o mundo e a única empresa
de computadores pessoais realmente lucrativa que sobrou. É assim que
Jobs deixa a Apple: no topo e com fôlego para ir além.
Mas a
coisa mais importante sobre o que Steve Jobs tem feito nos últimos 14
anos é simplesmente o fato de que tudo isso não se resume a Steve Jobs.
Ele construiu uma empresa que é sua imagem. Os executivos são pessoas
nas quais ele confia, pessoas que trabalharam com ele de forma
extremamente próxima e que entendem sua filosofia.
E alguém pode
ocupar o lugar de Steve Jobs? Claro que não. Ele é insubstituível, pelo
menos por uma única pessoa. Há uma razão pela qual ele vai entrar para
a história como um dos titãs do mundo dos negócios nos Estados Unidos:
ele é um talento raro. Pessoas como ele não surgem com frequência.
Tim Cook, novo CEO da Apple
Tim Cook, o novo CEO da Apple, não será Steve Jobs. Ele vai continuar tocando os
negócios com competência, como sempre fez. E há outros membros da
liderança da empresa que funcionarão como peças para montar esse
quebra-cabeça.
Jobs basicamente escreveu o manual de como a Apple deve funcionar,
mas os funcionários da Apple não ficam sentados esperando que ele diga o
que deve ser feito.
Há o risco de que a Apple perca o fôlego sem o seu comandante. Não há
garantias de que ela continue no ritmo atual, mesmo que Jobs
continuasse no comando. É muito difícil ver uma companhia ter um sucesso
tão espetacular por muito tempo. E não faltam exemplos de empresas que
perderam o rumo depois que seu líder carismático deixou o comando, como a
Disney.
Nada é definitivo na vida. Pode perguntar a Steve Jobs, que tem visto
o incrível sucesso da Apple por anos enquanto tem que lutar contra seus
lamentáveis problemas de saúde. Mas a Apple não está fadada a repetir
os erros da primeira era "pós-Jobs”. Ela é muito mais forte e
bem-sucedida, tem um time e uma cultura corporativa. E tem tido tempo
para lidar com a ideia de que seu CEO não dura para sempre.
A
indústria da tecnologia é dura e o caminho das mudanças segue um ritmo
acelerado. Mas se há uma companhia que tem condições no momento de
sobreviver e prosperar, mesmo sem Steve Jobs no comando, é a Apple. Cabe
a Tim Cook fazer com que o manual seja seguido.
Fonte: http://idgnow.uol.com.br/mercado/2011/08/25/opiniao-por-que-a-apple-nao-vai-naufragar-sem-steve-jobs/